Dizem que o fato a seguir narrado aconteceu em Minas Gerais, em Ubá.
Na cidade havia um senhor cujo apelido era Cabeçudo.
Nascera com uma cabeça grande, dessas cuja boina dá pra botar dentro, fácil, fácil, uma dúzia de laranjas.
Mas, fora isso, era um cara pacato, bonachão e paciente.
Não gostava, é claro, de ser chamado de Cabeçudo, mas desde os tempos do grupo escolar, tinha um chato que não o perdoava.
Onde quer que o encontrasse, dava-lhe uma bisca (palmada) na cabeça e perguntava:
- Tudo bom, Cabeçudo?
O Cabeçudo, já com seus quarenta e poucos anos, e o cara sempre zombando dele.
Um dia, depois do milésimo tapinha na sua cabeça, o Cabeçudo meteu a faca no zombeteiro e matou-o na hora.
A família da vítima era rica; a do Cabeçudo, pobre.
Não houve jeito de encontrar um advogado para defendê-lo, pois o crime tinha muitas testemunhas.
Depois de apelarem para advogados de Minas e do Rio, sem sucesso algum, resolveram procurar um tal de “Zé Caneado”, advogado que há muito tempo deixara a profissão, pois, como o próprio apelido indicava, vivia de porre.
Pois, não é que o “Zé Caneado” aceitou o caso? Passou a semana anterior ao julgamento sem botar uma gota de cachaça na boca! Na hora de defender o Cabeçudo, ele começou a sua peroração assim:
Meritíssimo juiz, honrado promotor, dignos membros do júri.
Quando todo mundo pensou que ele ia continuar a defesa, ele repetiu:
Meritíssimo juiz, honrado promotor, dignos membros do júri.
Repetiu a frase mais uma vez e foi advertido pelo juiz:
Peço ao advogado que, por favor, inicie a defesa.Zé Caneado, porém, fingiu que não ouviu e:
Meritíssimo juiz, honrado promotor, dignos membros do júri.
E o promotor:
- A defesa está tentando ridicularizar esta corte!
O juiz:
- Advirto ao advogado de defesa que se não apresentar imediatamente os seus argumentos…
Foi cortado por Zé Caneado, que repetiu:
Meritíssimo juiz, honrado promotor, dignos membros do júri.
O juiz não agüentou:
Seu moleque safado, seu bêbado irresponsável, está pensando que a Justiça é motivo de zombaria? Ponha-se daqui para fora antes que eu mande prendê-lo.
Foi então que o Zé Caneado disse:
Se por repetir apenas algumas vezes que o juiz é meritíssimo, que o promotor é honrado e que os membros do júri são dignos, os senhores me ameaçam de prisão, pensem na situação deste pobre homem, que durante quarenta anos, todos os dias da sua vida, foi chamado de Cabeçudo?Cabeçudo foi absolvido e o Zé voltou a tomar suas cachaças em Paz.
Moral da história: Mais vale um “Bêbado Inteligente” do que um “Alcoólatra Anônimo.”
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